Os restaurantes regressam lentamente à normalidade. “Dar a volta à crise: 27 medidas para o seu restaurante!” faz um resumo de medidas para implementar já no seu restaurante, antes que seja tarde. Nem que adote uma. Já está a dar a volta à crise.
Se há teorias psicossociais que todos conhecemos, uma seria a da adaptação e a outra a das necessidades de Maslow, sobretudo no que toca à necessidade fisiológica de comer e ao prazer necessário à vida, aqui o das experiências que a comida (e os restaurantes) nos proporcionam. Contando com este perfil adaptativo do ser humano e com a criatividade e inovação nos restaurantes, conto que a eles voltaremos num breve espaço de tempo sobretudo quando a tónica da confiança percebida pelos consumidores se juntar à confiança comunicada pelo passa-palavra do amigo do amigo que já lá esteve e se sentiu seguro.
Nós, Portugueses, necessitamos da mesa. Como instituição social que é, onde nos juntamos para fazer negócios, revisitar momentos, celebrar a vida e cultivar o amor, acabaremos todos por voltar a um restaurante… ou à mesa!
Por isso, o marasmo anunciado para o setor da Restauração tem servido de impulso a muitos proprietários e unidades que dotadas de conhecimento, formação, estrutura de negócio, criatividade e contas bem feitas têm agora a capacidade e a paz de espírito para se reinventarem num momento em que os ensinamentos da inovação são necessários e enquanto tudo o que referi atrás não regressa.
Radical ou cosmética, a verdade é que há muito tempo não víamos inovação de produto em restauração (com aceitação suficiente para que integrasse os processos de negócio dos Restaurantes e unidades hoteleiras). Víamos – isso sim – inovação no marketing e na organização, nos processos (pouco) mas não ao nível do produto. Do produto comercializado, entenda-se, e não das suas matérias primas.
E, em abono da verdade, com pouco espanto assistimos agora ao investimento em conceitos que formulados anteriormente no espectro teórico e então desajustados à realidade pré-Covid por não colherem da parte do grande público da restauração a mais bela das simpatias, podem agora ser a tábua de salvação de algumas unidades.
Tem graça! Comecei a escrever este artigo e pensei que ele se ia chamar “5 opções para um restaurante de sucesso no pós-Covid”. Enganei-me! São 27 opções para um restaurante de sucesso no pós-Covid.
#1 O not-so-new take away e delivery
Esqueça todos os preconceitos que tem com o take away e o delivery. Nesta fase, procure estes canais como impulsionadores do seu negócio que pode (ou não) abandonar mais tarde. Até o restaurante Noma, na Dinamarca, durante largos anos considerado o melhor restaurante do mundo começou a vender… hambúrgueres para fora! É o que tem que ser. E o que tem que ser tem muita força!
#2 Rent-a-Chef
Ou Chef em casa, vá. Não é de agora, de facto, a ideia de “alugar” um Chef para cozinhar na casa dos seus clientes. Mas esta pode muito bem ser uma opção para reduzir o contacto social e não prescindir de uma refeição de qualidade. Desafie o Chef do seu restaurante e determine qual o grau de prestação do serviço que pode ir desde a simples comparência do Chef até ao tratamento de toda a logística como tratar da louça de serviço, dos ingredientes, fazer a confeção in loco ou levar mise-en-place feita do restaurante… O céu é o limite!
#3 Menu e cocktalis DIY (tipo “Ikea”)
Os serviços de preparação de mise-en-place são mais um dos canais que todos os restaurantes e Chefs conhecem! Agora, a sua aceitação é diferente. Já é possível “vender” a ideia ao cliente final para que ele possa terminar a sua refeição em sua casa, seguindo o manual de instruções que previamente preparou. Aposte na comunicação da simplicidade e da qualidade dos produtos. A própria IKEA já o faz.
#4 Cestas de piquenique
Vender refeições para fora não significa vender comida para comer em casa. Há muitos momentos que as famílias vão passar a fazer ao ar livre, pela época do ano em que estamos, mas por ser mais seguro do que confraternizarem num espaço fechado. A indústria de cabazes sabe fazê-lo muito bem… Uma cesta de vime, uma toalha com padrões vermelhos e brancos, produtos de qualidade, frescos e off you go! Que o diga o Eleven que já começou a fazê-lo muito pelo magnífico jardim que tem imediatamente ao lado. Não se esqueça de cobrar uma caução pela cesta e de incluir um presente para crianças! Vão adorar e talvez fiquem seus embaixadores.
#5 Turnos
Exatamente porque a mesa é para nós um espaço e uma instituição social, nunca defendi a existência de turnos nos restaurantes. Aquela chatice de que só se pode comer entre as 19h e as 21h e das 21h30 às 23h30 é aborrecida porque coloca um prazo neste convívio. No entanto, para combater a redução forçada da capacidade do restaurante esta rotatividade pode agora contribuir para resultados e faturações superiores. Explique a necessidade aos clientes e garanta as medidas de desinfeção adequadas et voilà!
#6 Subconceitos (vinagretes, reduções, molhos, fermentados, azeites aromatizados)
Sabe todo aquele material que cria totalmente no seu restaurante? Os fermentados, os azeites aromatizados, molhos, vinagretes, etc… Porque não vendê-los também e torná-los numa fonte de receita? Já agora, veja o que anda a comprar que podia fazer no seu restaurante… Pode-lhe sair mais barato! 😉
#7 Menus semanais
Com as restrições de horário pode ser difícil assegurar um seating perfeito para cada refeição. Mas, porque não apostar num serviço de assinatura de comida com entrega ao domicílio? Menus semanais, com comida fresca ou congelada (se tiver delivery, sugiro que seja sempre fresca) em que os clientes podem personalizar o seu menu semanal dependendo das opções sugeridas!
#8 Go online – encomendas e reservas online
Ok! Pode parecer estranho. Mas tem mesmo (!) de apostar no digital. Faça um site (aproveite os alojamentos, os domínios e os sites que são simples de construir) para criar um sistema de reservas de lugares online, um sistema de encomendas para take away (também online). Acredite que o retorno compensa o esforço.
#9 Marketing digital – diz-lhe alguma coisa?
Já agora, go FULLY online. Dê uma perninha no marketing digital e avance com todas as armas que pode. Facebook, Instagram, Twitter, SEO, Adwords serão os seus melhores amigos. Aprenda online a usar estas ferramentas. Há milhares de sítios onde pode aprender a potenciar o seu negócio. Estar online é o novo estar vivo!
#10 Gamification
Todos conhecem o famoso cartão de fidelização de algumas casas de hambúrgueres ou de restaurantes de bairro. Hoje, mais do que nunca, é necessário criar uma relação de empatia e de proximidade com os clientes. Premeie os clientes por regressarem. Faça as suas contas e veja o que pode oferecer ao seu cliente, sem perder dinheiro, para lhe agradecer ele ter regressado.
#11 Política de Revenue Management para restaurantes? Sim!
Todos sabemos como funciona a venda de lugares num avião. Os primeiros pagam menos e os últimos pagam mais… Simples? Não. A venda de lugares em aviação tem algoritmos de gestão da procura e de receita que garantem o máximo retorno para a companhia porque… vendem pela escassez! Arranje um bom conceito, uma boa experiência, um bom motivo, um bom ingrediente, torne-os escassos e faça a mesma coisa. Garanta que aplica descontos no momento certo, aos clientes certos, com a ocupação certa.
#12 A Mesa do Chef
Não vamos mais longe. As mesas dos Chefs ou tão somente as experiências-diferentes-dentro-do-mesmo-restaurante são cada vez mais comuns. Menus próprios, mais caros, mais intimistas e mais exclusivos. É isto que as pessoas procuram numa nova experiência (e na mesa do Chef)! E com isso garante um retorno superior. A ideia é esta, mas pode ter 1001 aplicações dependendo da configuração do seu restaurante
#13 Analise o seu menu, aumente as suas vendas
Ganhe controlo! Diga isto para si mesmo! Várias vezes. Estes mantras são importantes. Neste momento podem não fazer falta todas as 44 opções de pasta ou os 27 hambúrgueres que o seu restaurante vende. Aplique metodologias de reengenharia de menus e torne-os mais simples e mais atrativos. K.I.S.S. – Keep it simple and smart!
#14 Faça dinheiro com os desperdícios
Estranho? Nem pensar! Há cada vez mais restaurantes a potenciar este canal de vendas, tipicamente no final do serviço, em que através de aplicações próprias conseguem escoar os stocks, especialmente as sobras que seriam desperdício (e não restos, importante esta diferença hein?). Conseguindo cobrir os custos dessa comida a ser servida, ainda tem uma margem para alguma receita (não muita). Mas, o que importa é não deitar dinheiro fora. Veja a Too Good to Go. O que importa é dar a volta à crise.
#15 Menu “Leve para casa”
Ao reduzir o menu, pode haver pratos que tem exclusivamente para levar para casa. Fazer cross-selling no restaurante não é nada de novo mas pode oferecer a um cliente sentado um desconto de 20% se decidir levar uma refeição para comer no outro dia ao almoço. Diferencie a oferta!
#16 Crie um menu de produtos locais para complementar a refeição
Com os 77 000 restaurantes que há em Portugal, ou inova ou fica para trás. Já percebeu isto não já? A inovação não é uma coisa que vem apenas nos livros. E por isso, tem ao seu redor muitos produtos que o distanciam dos demais! Andam os provadores de azeites a fazer esta campanha há muito tempo para que tenha um menu de azeites (locais, monovarietais ou blends) que harmonizem com a comida servida. Faça o mesmo com queijos, enchidos, sais temperados, conservas… (Tem dúvidas? Corte uma laranja, experimente temperar com um azeite virgem extra Azeite monovarietal de cobrançosa e experimente um blend mais comercial e vai perceber).
#17 Ofereça uma infusão
Claro que não é pelo chá…! Mas se tiver um canteiro com as suas ervas aromáticas de onde recolhe algumas prepare uma infusão ao cliente e ofereça no fim da refeição. Quente ou com umas pedrinhas de gelo, trará conforto e memória ao seu restaurante… Quem não gosta de um mimo?
#18 Faça um livro com as receitas mais icónicas do restaurante
Vá lá, não me diga que o seu restaurante tem segredos. Já viu os milhões de receitas e versões que há na internet? Mas há uma coisa que é única e que esse sim é o segredo. A receita feita no seu restaurante tem um sabor especial porque traz excelentes memórias ao seu cliente. Não tenha por isso medo de partilhar as suas receitas. Os clientes vão adorar ficar com um exemplar e para si é mais uma fonte de receitas. Olhe, vou-lhe confidenciar: tenho a receita da melhor sopa de peixe que já comi e foi na Sertã. Já fiz várias vezes e nunca ficou igual… Nem nunca ficará.
#19 Organize um mapa de produção e mise-en-place e faça from scratch
Organize-se. Use mapas de produção e de mise-en-place. Faça do zero. Não compre processados. Faça o mais que puder no restaurante. Poupa dinheiro e dá valor ao seu negócio. Não se esqueça de comunicar os seus esforços para que os clientes valorizem esse trabalho!
#20 Procure e incentive formação para o staff
Sejam parte ou não das horas de formação obrigatória, formação nunca é demais. Aplica-se sempre aquele pressuposto de gestão: “Formar os meus funcionários? Para quê? Um dia vão sair. E, enquanto permanecerem na sua equipa sem formação?”. Invista a médio e a longo prazo nas competências das pessoas. Há tantas formas de conseguir isto: presencial, on-the-job, online. Em competências culinárias, em atendimento ao cliente, online business, gestão de vendas, bartending, entre outras.
#21 Leia muito!
Esta é só uma desculpa que eu usei para lhe dar o seguinte conselho: despersonalize a gestão. Quantas vezes encontro proprietários de restaurantes que preconizam a microgestão cuja intromissão acaba por destruir o negócio? O restaurante e a sua pessoa não são a mesma coisa. O restaurante serve para dar dinheiro. Por isso, confie na sua equipa. Peça-lhes ajuda, estabeleça orientações de gestão claras. Leia mais! Ganham todos!
#22 Otimize as compras
Não prefira preço a qualidade, mas procure novos fornecedores com relações não viciadas e com ofertas comerciais adequadas ao rumo do seu restaurante. Com melhores tempos de resposta e logística, com maior sentido de parceria e produtos igual ou superiormente melhores para o seu negócio. Nem todos são seus amigos.
#23 Procure o que é local, com responsabilidade
Por causa disto mesmo que lhe falava agora mesmo sobre fornecedores e, novamente, porque não pensar local? Já olhou para o que se produz à sua volta? Analise a capacidade desses fornecedores e se o resultado for favorável, opte por estas cadeias curtas que são mais amigas do ambiente, mais humanas e socialmente responsáveis, eliminando ao mesmo tempo alguns intermediários indesejados. Uma vez mais comunique isso mesmo. No entanto, tenha sempre em atenção: local não significa de qualidade.
#24 A concorrência é nossa amiga
Well… Tem dias. Mas nos dias que correm, associar-se a restaurantes para fazer campanhas de divulgação, angariação, ou outra, mostra ao cliente que ele se deve juntar à “causa”. Assim, por estes dias não veja a sua concorrência como um mero inimigo a combater e junte-se a ela para todos ganharem escala. Já agora, veja o que eles estão a fazer bem feito e não tenho medo de mudar os seus processos de acordo.
#25 Esteja atento a fontes de financiamento…
…algumas que até são dadas a fundo perdido, como é o caso do programa ADAPTAR onde 50% dos investimentos que vai ter de fazer são comparticipados. Já viu do que pode o seu restaurante beneficiar? Consultoria para alterações do layout e do modelo de negócio, equipamentos para desinfeção, aparelhos para pagamentos contactless, sinalização, serviços de desinfeção são alguns dos exemplos de despesas elegíveis.
#26 Restaurantes all day long
Com mais pessoas em casa e com a fluidez nos momentos das refeições, já nem todas as famílias se reúnem às 13h para almoçar e ver o telejornal. Esta organização de refeições é do passado e atualmente as refeições são mais fluídas. Acontece comigo (não raras as vezes) que estando a trabalhar a partir de casa, acabo por almoçar às 15h e às 16h. E a essa hora já não há restaurantes abertos para almoçar ou Uber Eats para encomendar. Atreva-se, faça diferente. Reorganize a sua equipa e os seus horários (respeitando os limites) para abarcar um conjunto de clientes que tem vindo a ganhar uma importância cada vez maior.
#27 Readme.txt ou Leia isto antes de comer
Sobretudo nas refeições take-away ou delivery que são servidas numa embalagem de alumínio sem graça, é importante contar uma história ao cliente. Junte um QR code que remeta para um vídeo ou, no limite da não-criatividade, junte um panfleto e diga que a receita é da sua avó que nasceu na Galiza e veio para Portugal muita nova, onde encontrou muitas dificuldades para se estabelecer, mas este Polvo à galega é a prova de que conseguiu superar-se! Gostou? O cliente também vai adorar e as opções são milhares. Já todos vimos a animação de um pequeno cozinheiro numa projeção que acontecia numa mesa de um restaurante, em que ele cozinhava um prato e esse prato era servido em seguida. Um storytelling forte ajuda o cliente a criar uma experiência nova e não apenas a comer um prato novo.
Como se vê, não espero vir a acreditar na já propalada ladainha da morte anunciada do setor. Não sem pelo menos acreditar que há um caminho a esgotar – o da inovação em restauração. Ao contrário do que se pensa, defendo que a inovação na restauração não está esgotada em todas as suas dimensões.
res·tau·ran·te (do latim restaurans, -antis, particípio presente de restauro, -are, reparar, refazer) = Que restaura.
E se durante anos restaurou esta necessidade fisiológica e mais recentemente social, os restaurantes restaurar-se-ão e ultrapassarão esta prova de fogo – a da inovação e da capacidade de resiliência.
Óscar Cabral
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